Foi num mês de maio que embarquei atrás de um sonho: mochilar pela Europa. Passei dois meses trabalhando muito para juntar meus euros, o suficiente para comer qualquer coisa, dormir em qualquer lugar e conhecer tudo que tinha direito. Fui com duas amigas. O roteiro foi bem desplanejado, adaptado a todos os gostos e desgostos, do jeito que dava para ser. Eu sabia que iria gostar da viagem, claro, afinal viajar até para a casa do vizinho pode ser bom. Mas não sabia que encontraria um mundo encantado e que, como num conto-de-fadas, me transformaria.
Fui para lá com um certo medo, desses medos bons, do desconhecido, que se apresentam com friozinho na barriga e se desfazem devagarzinho, sem se deixar perceber, deixando só a segurança do novo.
E tudo o que podia aconteceu: fiz 10 vôos e fiquei craque, conheci três países diferentes e tirei fotos, falei inglês espanhol alemão francês italiano e português, ganhamos VIP, dançamos em uma balada na Ilha da Fantasia e fizemos amigos, fomos beber com o time de handebol, fizemos um filminho, comprei perfumes, comprei um rímel e aprendi a usar, descobri Nutella, conheci uma das praias mais paradisíacas do mundo, o topless virou normal, vi o sol às dez da noite e não dormi... carregamos a mala mais pesada do mundo, dormimos num albergue tombado, parei para ouvir uma sanfona e La Comparcita numa ruela de filme, experimentei tapas, encontrei brasileiros trabalhando por lá, sai à noite a pé com novos amigos, ganhei Morritos, conheci um palácio real, me encantei, encontrei Guernica, tirei foto do Gran Masturbador, não peguei fila, almocei tapas de 1 euro, andei com um guia particular, passei em frente ao restaurante mais antigo do mundo, endireitei a coluna para tirar foto, abri o mapa, corri para conhecer o máximo que podia e cheguei ao marco zero, passamos a mão no bumbum da estátua de bronze e tiramos fotos, andei de metrô, e terminei o dia com o sol no meu rosto enquanto via os touros perderem... carregamos as duas malas mais pesadas do mundo, andamos em círculos sob o sol, encontramos Alice no País das Maravilhas e quase deu errado, deu tudo certo, ficamos tão felizes, ficamos amigas, conhecemos uma Power Ranger de verdade (silver one!), fiquei reta para sair na foto, andamos, subimos, descemos, experimentamos gelato, conhecemos ruínas, tomamos gelato, vimos um monte de pedras e não entendemos nada, entrei no Coliseo, arrepiei, não quis mais sair, mas precisava de um gelato, esbarrei várias vezes em Vittorio Emanuele, joguei moedinha na fonte com a esperança de voltar, fomos às compras e não vimos o Papa, subimos 500 degraus, vimos os Santos lá de cima, tiramos muitas fotos, a Capela estava fechada e eu fiquei triste, nos desesperamos com a idéia do último gelato, entramos no castelo mais caro do mundo, ficamos cansadas felizes realizadas, jantamos pizza com vinho ao som de bossa nova, e admiramos as luzes do Coliseo à noite... acordamos de madrugada e carregamos as malas mais pesadas do mundo, saímos para andar e encontramos as ramblas, nos perdemos num mundo mágico de compras, comi chocolate na Boqueria, voltamos sem pernas, mas já que num faz-de-conta continuamos andando, subimos, subimos, subimos, alcançamos a vista mais linda, como-não-perceber a Sagrada Família, dançamos num jardim, tiramos fotos, rimos, nosso guia se perdeu, encontramos um castelo fechado, ganhamos uma recompensa: o mar, descobrimos como águas que dançam podem nos fazer chorar, revezamos a bicicleta desajeitada por 4 horas, comemos um gelato falsificado, resolvemos comer tapas, adotamos nossa adega preferida no mundo, vinho tinto por favor, água por favor, remédio por favor, deixamos nossa marca no albergue mais maluco do mundo, encontramos pessoas especiais, quisemos bem, trocamos email, ficamos felizes, e quase de surpresa nos separamos pela primeira vez... andei de avião sozinha com minha mochila, não precisei de uma flor amarela, fui bem recebida, participei de uma festa italiana com italianos, comi comida italiana feita por uma futura mamma, não consegui conversar, dei risada, reencontrei o gelato, fiquei feliz, vimos um homem desistir de se suicidar pulando da maior catedral gótica do mundo, reencontrei Vittorio Emanuele, dei três voltinhas no touro, não vi a Última Ceia, tiramos foto, fugimos de casa, ganhei abraço, fiquei feliz, sonhei, e pela última vez me despedi de novo... andei de avião sozinha com minha mochila, achei que português era outra língua, subi ladeira, desci ladeira, tirei foto, passei calor, passei o bondinho, virei tradutora, conheci de onde veio a história do meu país, tomei café com uma Pessoa única, falei sozinha, vi um rio que parece mar, vi a cidade enfeitada, entendi porque Lisboa é boa, fiz compras, descobri que pastel não é salgado e tirei foto, fui até onde jaz Camões, acordei e vi a banda passar, degustei vinho, ouvi o fado e senti saudade, reencontrei as duas, fomos para o Alto e vivemos a noite, ficamos muito felizes porque deu tudo tão certo, fui dormir com a música lá fora e chegou o dia em que o portal se abriu e eu tive que partir...
E fiquei assim, renovada, mais viajada, mais maquiada, mais ereta, mais tolerante, mais desencanada, mais encantada, com gostinho-de-quero-mais, com vontade de conhecer o mundo, com roupa nova, com óculos-de-sol novo, com um tênis velho, sem meu chinelo, sem meus euros, sem meu medo, sem metade, com novos amigos, com novas irmãs, com novos gostos, com novas escolhas, com novas saudades, com novas histórias e com fotos que-não-acabam-mais.

Um comentário:
Ai Carolzita....fantastico....sempre achei a gente meio parecida por repartir a mesma coca cola sem nojo...mas temos infinitas sensações comuns...beijos
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